#APDNews #APDCivil

Nos últimos anos, a jurisprudência brasileira tem evoluído significativamente no tocante à aplicação da Central Nacional de Indisponibilidade de Bens (CNIB) em execuções extrajudiciais. Essa evolução reflete um esforço contínuo de harmonizar a eficácia processual com a proteção dos direitos patrimoniais, respeitando os princípios constitucionais e processuais.
Fundamentos Jurídicos: Origem e Propósito da CNIB
A CNIB foi instituída pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) por meio do Provimento 39/2014, com base no artigo 30, III, da Lei 8.935/1994 e no artigo 185-A do Código Tributário Nacional (CTN). Seu objetivo é receber e divulgar ordens de indisponibilidade que atinjam patrimônios imobiliários indistintos, promovendo a efetividade da execução e a responsabilização patrimonial dos devedores. A medida busca assegurar que, caso um devedor não efetue o pagamento ou não apresente bens para penhora, seus bens possam ser indevidamente compulsados, garantindo a proteção dos direitos dos credores.
Evolução Jurisprudencial: Da Interpretação Restritiva à Abertura para Execuções Extrajudiciais
Historicamente, a jurisprudência limitava a aplicação do artigo 185-A do CTN a execuções fiscais tributárias. Contudo, essa interpretação restritiva começou a ser flexibilizada com a declaração de constitucionalidade do artigo 139, IV, do CPC pelo Supremo Tribunal Federal (STF), permitindo medidas executivas atípicas desde que respeitados os princípios da proporcionalidade e razoabilidade.
Recentemente, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) deliberou sobre a possibilidade de utilização da CNIB em ações de execução de títulos extrajudiciais ajuizadas por particulares. A decisão do STJ, concretizada em julgados como o Recurso Especial 1.969.105/MG e no AgInt no AREsp 1.896.942/RJ, reafirma a aplicabilidade da CNIB como um mecanismo subsidiário, a ser utilizado apenas após o esgotamento dos meios executivos tradicionais, como penhoras e busca de ativos por meio dos sistemas SisbaJud e RenaJud. Este entendimento se alinha ao princípio da duração razoável do processo, garantindo que as necessidades do credor sejam atendidas sem comprometer os direitos do devedor.
Princípios Norteadores: Razoabilidade, Proporcionalidade e Subsidiariedade
O uso da CNIB em execuções civis é subordinado a critérios de razoabilidade e proporcionalidade. A jurisprudência enfatiza que a medida deve ser subsidiária — apenas aplicável após o exaurimento dos meios executivos tradicionais — garantindo que a busca por satisfação do crédito do credor não resulte em onerosidade excessiva ao devedor. A função da CNIB como uma ferramenta proativa que informa sobre a indisponibilidade de bens reforça a necessidade de um equilíbrio entre a efetividade processual e a proteção dos direitos patrimoniais do executado.
A previsão de que a ordem de indisponibilidade seja limitada ao valor total exigível, conforme o §1º do artigo 185-A do CTN, promove um equilíbrio importante, reafirmando que a indisponibilidade não deve ultrapassar a dívida existente. Além disso, a CNIB proporciona um mecanismo de publicidade que confere segurança jurídica nas transações imobiliárias, tornando claro quais bens estão sob restrição.
Implicações e Desafios Futuros
A decisão do STJ solidifica a eficácia da CNIB como um instrumento relevante na execução civil entre particulares, possibilitando a proteção dos direitos dos credores e a necessária cautela na administração dos bens devedores. Ao permitir a utilização da CNIB em execuções de títulos extrajudiciais, a jurisprudência atual busca conciliar os direitos dos credores com garantias fundamentais do devedor, aprimorando a eficácia do sistema de justiça civil.
Assim, a jurisprudência brasileira continua a caminhar em direção a um sistema processual mais efetivo e equilibrado, que respeita tanto a busca por crédito quanto os limites impostos pela justiça equitativa e pelos direitos fundamentais. As futuras aplicações destes princípios continuarão a exigir um olhar atento para as especificidades de cada caso, respeitando o devido processo legal e promovendo um equilíbrio saudável entre eficácia executiva e proteção aos direitos fundamentais no contexto das execuções cíveis.